Pluma e Imensidão

Meus caros,

O que faço com tudo Isto? Me perguntei, quando li Pluma e Imensidão. Depois, fiquei sem ação, mas não era uma imobilidade ordinária, tratava-se do que a filosofia taoísta chama de wu-wei, que significa literalmente não-ação, um refreamento da atividade contrária à natureza. Nesse estado, compreendi a frase de Lao Tsé: "Através da não-ação, tudo pode ser feito". Ou, misturando-a com um verso do poema Pluma e Imensidão: uma nuvem pode ser atravessada em todas as direções. Este livro abre uma fenda sob nossos pés-asas (os aproveitei até para pisar com graça a mediocridade). Descemos e subimos concomitantemente através da beleza. E não me refiro somente à beleza agradável, delicada, mas também à beleza violenta, religiosa e erótica, todas com que me deparei neste livro, todas que convergem para o questionamento do ser. E, quando questionamos quem realmente somos, quando encaramos a esfinge interior, fatalmente sentimos aquele misto de prazer e pesar, ou como chamou Bataille, a nostalgia da continuidade perdida e o desejo angustiado da condição descontínua; sentimentos com os quais lidamos diariamente, mas que são potencializados e conscientizados em situações extremas, feito a morte e o amor, feito a arte, feito este livro. Ah, que deslocamento os aguarda, o deslocamento que assusta e fascina, que destrói e ressignifica, ao ponto de mostrar "tudo Isto" como o que absurdamente-simplesmente É: numinoso. Como no dia em que, enquanto escutava pela primeira vez Summertime, pensei: mesmo com todo o horror, eu voltaria ao planeta Terra, só para poder escutar esta música. E agora, meus caros, para ler este livro também.
Sem ranços de formalidade e comedimento (oxalá!)

Isadora Krieger